terça-feira, 29 de julho de 2008

Expedição do Patrimônio Vivo – 5º dia – Ingaí (MG) – Circuito Vale Verde e Quedas D’Água



Por Andressa Iza Gonçalves, Paulo de Morais e Sandra Maura Coelho. Fotos: Sansão Bogarim. Texto concluído às 2h17.
Após um fim de semana de descanso em Luminárias seguimos para o quinto dia da Expedição na cidade de Ingaí. A estrada nos reservava uma bela paisagem com fazendas em seu entorno, lacticínios e pastos.
Primeira Parada – 9h - Prefeitura Municipal de Ingaí


Fomos recebidos pelos funcionários Silas e André e pela prefeita Teresinha Angélica de Paiva, que nos contou sobre a principal atividade econômica do município, a agropecuária. Com cerca de 3 mil habitantes, a cidade sedia no dia 23 de junho, dia de São João, sua principal festa, quando é queimada a maior fogueira junina do estado.A Prefeitura trabalha também na organização da Festa do Milho, que acontece no mês de maio desde 2001.

Segunda Parada – 10 h – Casa de Heitor Miranda e Rita do Carmo Junqueira de Miranda




Chegamos à residência do casal e percebemos a presença de filhos, netos e bisnetos, demonstrando que ali morava uma família numerosa. Deixamos Dona Rita fazendo o almoço e fomos até o quintal para ouvir as histórias de Seu Heitor, ingaiense de 85 anos, filhos de Ana Bernardo e Severino Rodrigues.
Esse simpático senhor, vaidoso, perguntou se deveria tirar o chapéu e pentear seus cabelos grisalhos. Sorrindo, aconselhamos a ficar como estava. Iniciamos a conversa perguntando sobre a história de Ingaí e percebemos que estávamos diante da pessoa certa para tratarmos do assunto.
Ele nos contou como era a cidade antigamente: “a igreja antiga era de adobe e oitão (telhado partido ao meio), foi construída em homenagem a São Sebastião. O arraial era campo, tinha pouca casa e tudo de sapé, agora mudou, foi juntando gente e agora é casa de telha”. Neste momento, lembrou de como surgiu a famosa Festa da Fogueira: “ Era 3 horas da tarde e caiu um raio na igreja que pegou fogo. Ai o povo fez promessa para nunca mais cair raio e então todo ano no dia de São João, 23 de junho agente faz a fogueira. Cada ano a fogueira aumenta, hoje ela tem mais de 20 metros de altura”. Seu Heitor continua a prosa lembrando que aos 14 anos já ajudava como todos na montagem da fogueira, carregando nas costas as toras de madeira. Só parou há alguns anos por causa da idade porem ate hoje continua participando como observador da festa.
Filho de uma dona de casa e pai pedreiro, seu Heitor simpaticamente conta que trabalhou numa fábrica de queijo e foi boiadeiro. Ele lembra que transportava até 400 bois para o interior do Rio Janeiro com mais sete homens, em viagens que duravam até 30 dias: “Era tudo a pé, por ordem do patrão. Nós gastava até quatro alpercatas pra chegar até lá. Levava berrante, arroz, feijão e toicinho na comitiva (burros de carga). Nós voltava de trem, subia em Teodoro e descia em Paulo Freitas. De Paulo Freitas, vinha a pé pra Ingaí”.




Ao fim da conversa, seu Heitor contou que, por causa da idade, não consegue mais andar de bicicleta. Por isso, ele encomendou a adaptação de uma bicicleta para um triciclo, com o qual ele costuma visitar o filho na única agência dos Correios da cidade. Terminando o papo, ele se mostrou grato pela conversa e emendou: “Calma, gente, é muito cedo, a prosa tá boa”. Era hora de irmos conversar com a esposa, dona Rita.


Fomos para a sala da casa, onde conhecemos mais sobre Rita do Carmo Junqueira de Miranda, de 83 anos, nascida em Ingaí e criada em Lavras. Neta do oleiro Antônio Luís Brás, a altiva senhora contou que foi matriculada em uma escola muito rigorosa de Lavras, mantida por padres. Na época, teve de aprender latim, exigência dos párocos para que os alunos pudessem acompanhar as missas. Estudou até o equivalente à sétima série e, então, foi convocada pela comunidade para dar aula na antiga Casa da Instrução de Ingaí. “Era um prédio antigo, muito bonito. Não tinha banheiro, o banheiro era atrás da bananeira. Foi uma pena terem derrubado a casa, porque ela era patrimônio histórico da cidade”, lamenta a educadora.
Dona Rita foi professora durante 20 anos, e em outros cinco foi diretora da escola. Visivelmente emocionada, ela detalhou seus tempos de professora, quando a oferta destes profissionais era escassa. Ela ressaltou que os alunos tinham muito mais respeito pelo educador e que alguns escreviam na borda de jornais tamanha a dificuldade em comprar caderno. Nas salas, os estudantes usavam a pena para escrever e lousinha de pedra para as operações matemáticas. “Meu caderno era a memória, porque a lousa apagava”, lembra.
A contato com os filhos e netos de Dona Rita confirmou que estávamos mesmo na casa de uma professora, tamanha era a educação de todos. O cafezinho e o bolo de fubá encerraram o bate-papo com chave de ouro.
Terceira parada – 14h07 – Casa de Sebastiana Iza de Morais

Chegamos à casa desta cozinheira de mão cheia e agradavelmente fomos recebidos com uma bandeja de bolo de milho com côco que derretia na boca. Tínhamos acabado de almoçar, mas aqueles pedaços foram irresistíveis. Tímida, dona Tianinha, como é conhecida, contou sobre a receita que a deu o título de campeã da Festa do Milho deste ano: os pavês doce e salgado. À medida em que ela ia enumerando suas especialidades, nosso apetite ia se reabrindo aos poucos: pão de cebola, pão doce, pão de milho, bolo de frango, salgado, canjica, salpicão, estrogonofe e feijoada. “Tudo tem segredo”, garante.
Dona Tianinha nos presenteou com deliciosos chup-chups, de kiwi, céu azul, doce de leite e leite condensado, que tomamos sentados sob a sombra de uma frondosa árvore atrás da igreja. A conversa foi bastante agradável e rendeu a indicação de uma ex-lavadeira, que ensinou Tianinha a lavar roupa.
Quarta parada – 15h04 – Casa de Manuela Gabriela Filomena

Entrando pela casa de Dona Manuela, fomos direto para a cozinha, o coração da casa, cenário ideal para uma boa prosa. No alto de seus 84 anos, contou que nasceu da fazenda do senhor Ramiro, no município de Ingaí. Desde criança, era levada pela mãe, Maria Filomena Cândida de Jesus, para a lida na roça. Dos nove irmãos que teve, apenas um está vivo. Não estudou, pois os pais não deixavam pela falta de um acompanhante que pudesse levá-los à escola. “Eu não sei leitura, não sei escrever meu nome. Mamãe criava a gente tudo junto, ela não deixava a gente andar sozinho”, contou.
Dona Manuela lembrou que aprendeu a lavar roupa com a mãe. As duas e os irmãos iam para a beira do córrego, onde batiam roupa. O sabão, naquele tempo, era feito artesanalmente. No barreleiro, juntava gordura de frango, porco ou vaca para fazer o sabão de cinza. A dona de casa contou que ainda produz sabão e, diante de nossa curiosidade, foi buscar um exemplar de seu produto, que tinha feito no último fim de semana com sebo de galinha.
Ela comentou sobre a diferença de costumes entre a geração da qual fez parte e a de hoje: “De primeiro, num certo ponto era fácil. Hoje, tem tudo para comprar. Antigamente, quem plantava tinha tudo”. Depois de um bate-papo revelador, nos despedimos de Ingaí e partimos para a pernoite em Itumirim.

Não perca amanhã a visita da Expedição do Patrimônio Vivo a Itumirim, incluindo os distritos de Macuco e Rosário.

5 comentários:

Unknown disse...

Eta pessoal que anda por estas terras de Minas!! Quantas maravilhas vocês têm encontrado... faz brotar água nos olhos quando a gente vê todo esse povo e paisagens!! E aí percebemos a importância deste projeto... registro, valorização e encantamento!!
Sucesso a vocês!!
Luis Felipe.

Anônimo disse...

Eu conheci hoje este trabalho do "vira minas",[ é assim mesmo o titulo?], e o achei explendido .
Contar causos de nossas cidades mineiras,fazer crescer em nós o orgulho de sermos destas"bandas das alterosas",em fim mostrar um pouco do rico patrimonio vivo que temos em nossas cidades.
Eu sou de Ingaí/Luminárias,na verdade sou de Ingaí, mas como minha família é toda de Luminárias, eu também me considero um pouco de lá também né, pois sempre nas ferias escolares eu ia para lá e conheço muitos dos personagens entrevistados, como o Padre waldir, a dona Rita e o senhor Heitor e também as dona Luci e Zelina de Luminárias, que infelismente esta ultima veio a falecer em julho passado.
Hoje moro em Lavras-MG, mas todos os fins de semana eu vou para a casa de meu pai em Ingaí e é muito bom estar lá naquela cidade calma, sem os "extresses" da cidade grande.
Parabéns à vcs por este trabalho, que Deus os acompanhe e de forças sempre.

vbeur disse...

Que satisfação e alegria ver meus avós "Seu Heitor Miranda e Dona Rita do Carmo" serem intrevistados por vocês... Estou no Paraná, e faz 3 anos que não os vejo... Eles são minhas raízes de mineiro... Parabéns pela equipe do Viraminas, por manter viva a memória dessa gente simples que de fato faz a verdadeira história de nossa Minas Gerais e de nosso Brasil...
Sou Vicente Beur Miranda Lima, professor da rede estadual do Paraná!!!
Valeu gente!!!

Anônimo disse...

Que satisfação e alegria ver meus tios "Seu Heitor Miranda e Dona Rita do Carmo" serem intrevistados por vocês... Estou em Brusque Santa Catarina, e fazia 7 anos que não os via... estive lá agora no final do ano depois do natal, foram só 2 dias mas valeu demais sô! Ele é irmão de meu saudoso pai e por isso... são minhas raízes de mineiro... Parabéns pela equipe do Viraminas, por manter viva a memória dessa gente simples que de fato faz a verdadeira história de nossa Minas Gerais e de nosso Brasil...
Aproveitei parte do comentário de meu primo, Vicente Beur Miranda Lima, professor da rede estadual do Paraná!!! Meu nome Pedro Tavares de Lima.
Valeu gente!!! Valeu demais da conta uai....

Unknown disse...

É com muita alegria e emoção que escrevo, do pouco que conheci da cidade de Ingaí; fui na festa de são joão, voltei ontem,fiquei na casa de uma família maravilhosa, que me receberam como uma amiga,dormi, almocei,comida deliciosa, café com bolo, tudo regado com muito amor fraterno;e eu os conheci no dia 23/06/2010;já sou convidada a voltar e com certeza eu voltarei;O meu muito obrigada ao sr.Heitor Miranda e D.Rita do Carmo,a todos os familiares; Luzia da Silva Evora-São Paulo-sp -25/06/2010