sexta-feira, 26 de março de 2010

Mídias Livres e Cultura Digital: querem retroceder nos avanços da internet



Participei hoje cedo do encontro de mídias livres e cultura digital da Teia. O debate começou já engajado, objetivo e com muita lenha na fogueira, deixando os ânimos já agitados. Algumas observações dos participantes merecem destaque. A começar pelo colega Marcelo Branco, da Associação Software Livre, que levantou a bandeira da liberdade na rede.

Conforme ele informou pelo twitter, países liderados pelos Estados Unidos e pelo Japão estão se movimentando para construir um acordo comercial em nível mundial que dê garantias contra pirataria, envolvendo limitações a compartilhamento de arquivos em redes P2P. Querendo ou não, trata-se de uma versão globalizada do famigerado AI-5 Digital, aquele projeto de lei do Senador Azeredo que proíbe práticas corriqueiras na rede e burocratiza o acesso à internet.

Sob a máscara do combate à pirataria se esconde, na verdade, um temível lobby da indústria do copyright que visa ceifar a possibilidade de criação de novas redes de fruição e distribuição de bens culturais. Sim, pois a base da indústria cultural (leia-se Hollywood, adjacências) não está no domínio da produção de filmes, mas, sim, no monopólio da distribuição, que garante ao mesmo filme ser exibido em São Sebastião do Paraíso, Luanda e Bangladesh simultaneamente.

Então os hackers criam uma rede de computadores contra-hegemônica que se espalha de forma exponencial pelo mundo inteiro, facilitando as comunicações e o intercâmbio cultural. A base do sucesso dessa rede está na facilidade de se copiar, de compartilhar dados e informações. O que fazem os barões da indústria cultural? Tentam criar mecanismos para barrar o que a rede tem de mais fantástico: a facilidade de compartilhamento. É ou não é um contrassenso? Por que retroceder num processo que vem fazendo tão bem para a humanidade?



O tom do debate correu também para o Plano Nacional de Banda Larga, o qual vem sendo achincalhado pela grande mídia brasileira, reconhecidamente adepta do lobby do copyright. A revista Época, por exemplo, publicou recentemente uma "matéria" comparando a estratégia de federalização de redes de fibra ótica pela Telebrás com o ressurgimento de Jason e Fred Kruegger.

Por trás do discurso canhestro está o interesse das empresas de comunicação, que vêm podando por meio de filtros o uso de tecnologias de voz sobre IP (como o Skype) e de compartilhamento de arquivos em P2P (como torrents e emule). Essas empresas simplesmente criam barreiras para os usuários, piorando a qualidade da conexão de Voip. Dizem que é para garantir a qualidade da conexão, mas, evidentementemente, estão tremendo nas bases, com medo de que o acesso livre à internet reduza os ganhos bilionários que têm com as vergonhosas tarifas de celulares.

Quem assina internet via rede 3G, por exemplo, pode checar que, no contrato, está expresso que o usuário não tem direito a usar tecnologia de Voz sobre IP nem compartilhamento de arquivos por torrent? Qual é a briga, então? A garantia da neutralidade da rede: nenhum servidor poderá definir critérios mercadológicos para podar uma ou outra tecnologia de comunicação. A rede deve ser livre, sem filtros.

Atualização às 20h: à tarde, o debate foi dividido. O pessoal de Mídias Livres foi separado da galera do Cultura Digital. O foco do debate mudou um pouco, passando das políticas públicas de internet, mais amplo, para o tema do papel das mídias alternativas no Brasil, mais específico. A roda contou com representantes do MinC, que ressaltaram o fato de o Brasil ser o único país (pelo que se sabe) a contar com políticas públicas de fomento (incentivo financeiro) a mídias livres.

Discutimos também o papel dos novos meios como incentivador da leitura crítica da mídia pela comunidade. Muitos blogs ditos alternativos criticam a mídia tradicional, mas fazem isso pautando-se pela própria grande mídia, repercutindo diariamente o que ela informa. Em ano eleitoral, este ponto fica ainda mais visível. Ressaltamos o fato de os pontos de mídia livre terem que se dedicar à cobertura das construções de políticas públicas, inclusive propondo temáticas que suscitem a discussão destas políticas.

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