sexta-feira, 11 de junho de 2010

Na Colônia Padre Damião, em Ubá, filhos e netos de ex-hansenianos dão função a espaços abandonados pelo Estado

Depois de Bambuí, que teve em maio a visita do Museu da Oralidade, foi a vez de Ubá, cidade da zona da mata mineira, receber a oficina de metodologia em memória oral. Ubá é sede da Casa de Saúde Padre Damião (CSPD), uma das quatro ex-colônias de hanseníase de Minas Gerais. Na prática, a ex-colônia fica mais próxima da cidade de Tocantins do que propriamente de Ubá.


A viagem entre Belo Horizonte e Ubá é tranquila, principalmente enquanto é feita pela BR-040. Alguns quilômetros antes de Barbacena, o carro segue por outra estrada menor, sem acostamentos, com mais de 200 curvas segundo contagem extra-oficial. Seria um trecho de fazer qualquer um se sentir mal não fosse a bela vista do alto da serra, de onde se avistam cachoeiras, montanhas, casarões antigos e muito verde.



A colônia Padre Damião tem semelhanças e peculiaridades em relação às similares Santa Fé (Três Corações) e São Francisco de Assis (Bambuí). A começar pela localização na zona rural, situação típica dos locais onde eram internados os chamados "leprosos". A chegada é pelos prédios dos hospitais, que a exemplo das demais casas de saúde, ainda funcionam com atendimento à população. Eles cercam uma praça bem conservada (foto acima), mantida pela Fundação Hospitalar de Minas Gerais (FHEMIG).


Atrás dos hospitais, estão os pavilhões onde antigamente os hansenianos moravam (foto acima). Alguns ainda são moradias dos remanescentes do tempo da internação compulsória. Ao contrário de Bambuí e Três Corações, praticamente não há pavilhões abandonados na ex-colônia de Ubá. Mas não que isso fosse vontade do governo de Minas Gerais, responsável pela manutenção dos espaços. Os prédios onde funcionavam habitações de doentes foram ocupados por filhos e netos dos antigos moradores. Como edifícios públicos não podem ser alvos de usucapião, a ocupação é considerada ilegal e tida pela Fhemig como "invasão". Não por acaso o assunto é tratado como altamente delicado por funcionários da instituição.



Além dos pavilhões, terrenos baldios nos arredores foram ocupados por descendentes dos ex-hansenianos. Muita gente contruiu casa por ali. Alguns são mais caprichosos e tiveram condições de rebocar e pintar a fachada. Outros estão com tijolos aparentes. E não são apenas residências: muitos moradores aproveitaram para construir "puxadinhos", onde funcionam bares, restaurantes e mercearias. É o caso, por exemplo, de Marli de Assis, que tem uma venda de ração para gado e animais domésticos (foto acima). Frequentadora da igreja Deus é Amor que funciona no pavilhão ao lado da casa que construiu com o ex-marido, ela contou que é filha de pai e mãe hansenianos, que vieram para Ubá por conta da doença.



 Caminhando pelo local é fácil estimar que devem morar por ali cerca de 2 mil pessoas, que têm água e luz custeados pelo Estado, uma vez que estão em terreno público. A ocupação dos espaços, por si só, não é propriamente negativa. Se as colônias foram construídas com recurso público, é de se esperar que os espaços sirvam para alguma finalidade social, a fim de se evitar desperdício de dinheiro. Em Bambuí e Três Corações, por exemplo, tudo indica que os vários pavilhões abandonados irão para o chão em breve, pois não há solução politicamente viável à vista para dar funcionalidade a tantos prédios.

O que complica a situação, no entanto, é a vulnerabilidade à qual os moradores estão submetidos. Como estão numa espécie de "terreno sem dono", faltam opções de lazer, esporte, cultura e serviços em geral. É comum ouvir de alguns moradores o relato de que os jovens consomem e vendem drogas no local, com destaque para o crack. Como também não possuem escritura dos terrenos ou dos pavilhões, existe a possibilidade de serem removidos com um termo de reintegração de posse.

A memória oral será adotada pela comissão de memória da FHEMIG local para valorizar os saberes que os ex-hansenianos ainda guardam. Ubá será a terceira ex-colônia de Minas a realizar o Mutirão de Histórias de Vida, depois de Bambuí e Três Corações.

1 comentários:

Anônimo disse...

Na realidade, a Colônia Padre Damião situa-se em uma localidade que já faz parte da área urbana de Ubá. A proximidade em questão é que Ubá cresceu muito nesta região
(sul da cidade) e se aproximando mais do município de Tocantins.